Um pouco além de ser vegetariano
Ser vegetariano começa a ser uma tomada de consciência cada vez mais presente nos dias de hoje. Uns por razões de dieta, outros por questões ideológicas. Podemos considerar que tudo o que seja verdadeiramente bom para nós e para os outros está correto, mas precisamos ter um entendimento real do que está além de ser vegetariano.
Em quaisquer decisões que tomemos na nossa vida, precisamos sempre o fazer em harmonia e equilíbrio. Por exemplo de optamos por uma alimentação vegetariana ou vegan, precisamos observar e sermos observados se realmente é a melhor alimentação para o nosso tipo de corpo e necessidades do dia-a-dia, caso contrário, grandes desequilíbrios poderão surgir e originar doença.
Se nos tornarmos vegetarianos por ideologia, então há muito mais ainda que devemos ter em consideração, precisamos ir bem além do não consumir carne animal e compreender tudo o que está por detrás desse conceito.
Ser vegetariado por ideologia – o que esta além desse princípio
Quando optamos por não comer carne animal, muitas vezes é por pena de todos os seres vivos e por considerarmos desnecessário o seu sacrifício. Esse é um preceito que se segue corretamente, mas por vezes deixam-se outras coisas para traz como continuar a beber álcool, fumar, fumar “outras coisas” além de tabaco, ter más atitudes, entre muito mais.
Das culturas orientais surge este conceito do vegetarianismo, ou até mesmo de movimentos espirituais ocidentais, principalmente do século XIX. Indo observar aqueles que são movimentos milenares, observemos o Budismo.
No Budismo existem cinco preceitos. Eles indicam claramente cinco atitudes que os budistas devem adotar, em cada passo da sua mudança de consciência:
- Não matar (onde se inclui a vontade de ser vegetariano);
- Não roubar;
- Não mentir;
- Não ter má conduta sexual;
- Não se entorpecer com álcool ou drogas.
Não matar
Não matar é um preceito que nos fala sobre respeito por todos os seres. Este não matar é também algo que pode ser entendido como não magoar, o que nos faz ter ainda mais consciência dos nossos atos, palavras e pensamentos.
Sobre o comer carne, Buda indicava algo de muito interessante no seu Sutra do Grande Nirvana.
Aqueles que comem carne perturbam o desenvolvimento da grande compaixão. Onde quer que andem, parem, se sentem ou se deitem, o cheiro da carne que comeram pode ser sentido por outros seres sencientes, os quais, consequentemente, se amedrontam.
Sutra do Grande Nirvana
Mas será que ao comer vegetais não estaremos também a incorrer no mesmo erro?
Sim e não. Segundo Buda, os animais têm também consciência e como tal, devem ser respeitados pois estão também a fazer um caminho como nós próprios. No entanto, também as plantas são dotadas de uma natureza búdica e estudos recentes mostram reações perante situações e algo que para nós seria identificado como emoções. É por isso mesmo que algumas religiões e movimentos como o Jainismo tentam observar o máximo possível de Ahimsa, a não violência para com tudo o que é vivo.
Pessoas que gostam de matar causam repulsa noutros seres vivos, ao passo que aquelas que não gostam de matar atraem para si os outros seres vivos.
Tratado sobre a Perfeição da Grande Sabedoria
Não roubar
Muitas vezes usamos coisas que não são nossas para benefício próprio e consideramos apenas oportunidade. De um ponto de vista kármico é algo como roubar. Quando alguém se apega a essas oportunidades, ficam a considerá-las um direito e, a partir daí, muito sofrimento pode surgir e desenvolverem-se as sementes da cobiça e da raiva.
Não roubar também nos ensina a saber valorizar. Por vezes não queremos roubar ninguém, mas queremos ter a melhor vantagem para nós mesmos, então desvalorizamos o outro. Se o outro estiver em grande necessidade, ele sucumbirá a essa desvalorização. Que erro cometemos nós?
O Buda disse:
“Ananda, como ignoram a verdade, os seres sencientes aferram-se aos seus desejos e ocultam A sua sabedoria sob o véu das suas ideias preconcebidas”.
BUDA, Sutra do Grande Nirvana
Não mentir
Podemos mentir omitindo ou mentir intencionalmente. Por vezes julga-se que apenas se conta meia verdade, ou melhor, meia mentira, o que é algo que pode levar às mesmas condições prejudiciais da mentira por si. A duplicidade, a distorção da verdade, poderá ser também um ato muito grave pois trata-se da manipulação da realidade e até da vida dos outros.
Aquele que mente ilude – primeiramente a si próprio e depois aos outros. Trata a verdade como se fosse falsa e o falso como verdadeiro. Confundindo totalmente o verdadeiro e o falso, não consegue aprender o que é benéfico. Ele é como um recipiente tapado no qual a água limpa não pode ser despejada.
Tratado sobre a Perfeição da Grande Sabedoria
Não ter má conduta sexual
A má conduta sexual toca também nos preceitos anteriores, o que implica termos respeito por todos e não mentirmos e não os desvalorizarmos.
Muitas vezes a má conduta vem de uma má consideração por nós próprios ou por uma falta de olhar para os outros com o respeito que merecem. O que este preceito também nos pede é uma vida em equilíbrio, o que nada tem a ver com ser celibatário, esta parte apenas está reservada aos monges.
Não abusar de drogas ou bebidas alcoólicas
Quando estamos alterados pelo uso de substâncias entorpecedoras ou que alteram a nossa vigilância, a consciência fica nublada, distante e o resultado das nossas ações, palavras e pensamentos, poderá ser o que não queremos.
Este é um preceito que em primeiro lugar nos indica que estas substâncias são más para nós próprios e que nos levam a perder o autocontrole, por opção própria, tal poderá ter efeitos no nosso próprio discernimento sobre o que é bom ou mau, o que é correto ou incorreto na vida.
E queres passar uma vida inconsciente ou consciente?
Quem quiser atravessar o grande oceano do nascimento e da morte deve observar os Cinco Preceitos de todo o coração e com a mente por inteiro.
Sutra Upasaka-shila (Sutra sobre os Preceitos de Upasaka)
Como vês, ser vegetariano poderá ter muito mais por detrás como atitude que apenas o não matar seres vivos, ou consumir a sua carne, na verdade, isso nada é se apesar de não consumires outros seres te destróis a ti mesmo. A vida deu-te vida e tens uma responsabilidade para com a vida.
Aquele que observa os Cinco Preceitos é sempre superior até mesmo que o mais rico e poderoso que os viola.
A fragrância das flores e da doce madeira ao longe não pode ser sentida, mas a doce fragrância da moralidade em todas as dez direções será sentida.
Aquele que observa os Cinco Preceitos está sempre alegre e satisfeito e sua boa reputação à distância será conhecida; seres celestiais amor e respeito por ele sentirão e a sua vida neste mundo será com doce êxtase preenchida.
Tratado sobre a Perfeição da Grande Sabedoria
Estes preceitos Budistas não são também para serem encarados de uma forma radical. Há uma história em que um barman pergunta a um monge. “Mestre, sou budista e vendo bebidas alcoólicas aos outros, será que devo desistir do meu trabalho? Mas preciso dele para viver”.
O Mestre indicou-lhe o seguinte “Quando tiveres condições para saíres e não tiveres que vender mais bebidas alcoólicas aos outros, então será a altura de o fazeres”.
Como vês, tudo em harmonia, a tomada de consciência deve ser feita pelo caminho do meio.
Um comentário
Jorge Viana
Artigo fantástico João, o Universo trouxe-te como meu Sensei e não foi por acaso.
As modas e as tendências, por cardume, rebanho, bando, vara, alcateia seja o que for no reino animal que não sejam de protecção e sobrevivência, na sua maioria não trazem bons resultados, no entanto o Ser Humano continua a insistir em fazê-lo por moda ou apenas por tentar ser aceite, podem trazer resultados não muito positivos.
De uma forma tão delicada e cheia de amor incondicional cocegues dizer tudo isto, e para os que só ouvem o que lhes interessa. TENHAM CUIDADO AO TORNAREM-SE VEGETARIANOS OU VEGAN, FAÇAM-SE ACOMPANHAR POR UM MÉDICO. E CUIDEM DE TUDO O RESTO QUE O JOÃO TÃO BEM ABORDOU NO ARTIGO. O caminho não se faz só para o que dá jeito, cuidem-se.
Grande abraço Mestre